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7 de maio de 2017

A CAMINHO DO APA, LAGUNA, PARAGUAI - 06 NA COLÔNIA DE MIRANDA E O REENCONTRO DO GUIA LOPES COM O FILHO

CAPITULO V

AS FORÇAS EM OPERAÇÕES NO SUL DA PROVÍNCIA DE MATO GROSSO
Estacionado na Colônia Militar de Miranda 
Do Reconhecimento da fronteira ao reencontro com prisioneiros fugitivos 25 de março a 13 de abril de 1867
PARTE 1 - Reconhecimento
a) Missão de Reconhecimento da Fronteira pelo Batalhão Nº. 21º

O Batalhão Nº. 21º recebeu de improviso ordem de escoltar os engenheiros a uma exploração dos sítios circunvizinhos à colônia e, com efeito no dia 25 o tenente-coronel Juvêncio e dois dos seus ajudantes saturam do campo e foram até o ponto chamado Retiro, que notaram ter sido evacuado mui recentemente por uma força paraguaia de cerca de cem homens. Feito o reconhecimento, a nossa comissão tornou ao acampamento nessa mesma tarde; os infantes que nos acompanhavam, tiveram de transpor oito compridas léguas, com as mochilas, as armas e as patronas carregadas com sessenta cartuchos; mas pudemos muitas vezes observar que não há marcha que assuste ao soldado brasileiro.

Os dias seguintes passaram-se para nós na inação e nesse grave repouso do pensamento que é conselho de prudência nas vésperas de empresas arriscadas. Cada homem deve a si próprio o não perturbar-se com o espetáculo antecipado de infortúnios que talvez se não realizem, e também o não entregar-se à cega confiança no futuro que acrescentaria a catástrofe todo o rigor do imprevisto.

Abril, o mês marcado para as nossas provações, começara.

b) Os grupos de mulheres, a salubridade na Colônia de Miranda, a banda de música

O nosso principal recurso para a alimentação não estava por forma alguma garantido; mas uma como abundância parecia reinar no acampamento. Contínua afluência de carretas a ele trazia, com toda a sorte de fazendas[1], outros objetos de luxo que essas paragens desertas jamais tinham certamente visto; e as mulheres dos soldados, em pôs desse movimento do comércio, desciam de Nioac em grupos cada vez mais numerosos.

A fama de salubridade de que gozava a colônia de Miranda contribuía um tanto para essa concorrência; era para ali com efeito que, muito tempo antes da invasão estrangeira, a região circunvizinha enviava os seus convalescentes e os seus valetudinários. O rio volve ali as águas cristalinas que as infiltrações salobras dos pântanos inferiores ainda não conspurcaram.

O estado sanitário dos soldados nada deixava a desejar; por isso os exercícios quotidianos de todos os batalhões tinham recomeçado; as nossas músicas, rompendo afinal o longo silêncio, alegravam os espíritos, principalmente a dos voluntários de Minas, que fora organizada com cuidado, tocava sinfonias cuja novidade para os ecos do lugar trazia novo encanto ao ouvi-las.
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Notas de Referências
[1] Fazendas, significados: Atualmente é entendida como "grande propriedade rural", onde são gerados vários produtos agrícolas, No entanto, neste contexto é empregada para designar "pano ou tecido," visto que com a chegada da Revolução Industrial o primeiro produto, a principal mercadoria produzida em larga escala foi o tecido. Na região Sul do Brasil ainda é muito utilizada esta linguagem na fala.
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c) Missão de Reconhecimento da Fronteira pelo Batalhão nº 17, 10 de abril 1867

O Batalhão Nº. 17º recebeu dentro em breve ordem de ir, além do ponto até onde fora o Batalhão Nº. 21º, fazer um reconhecimento sob a direção do guia Francisco Lopes e com um grupo de índios terenas e guaicurus que, havia algum tempo, tinham-se apresentado ao coronel.

A partida efetuou-se no dia 10 de Abril, com bandeiras desfraldadas e música na frente, espetáculo sempre imponente ao aproximar-se o perigo. Esse corpo fora posto, graças aos cuidados que com ele tivera o comandante, em um pé de disciplina, que tê-lo-ia tornado notável ainda no meio do nosso exército acampado diante de Humaitá[2], alvo da nossa emulação militar, a que volviam todas as nossas apreciações.

A província de Minas, donde eram quase todos os homens do Batalhão, dá um soldado resistente, rijo por natureza, em extremo resignado, o qual não conhece o desânimo ainda nas circunstâncias mais críticas, não é até inferior ao paulista em audácia e temeridade.

No dia seguinte tivemos um espetáculo inesperado e de alguma forma cheio de emoções de família. Uma mulher que chegava de Nioac, veio dizer-nos que encontrara à margem de uma torrente[3] vizinha um grupo de cavaleiros, falando entre si o espanhol e que depois de haver lhe dirigido algumas perguntas, tinham-na deixado passar tranquilamente.

O coronel tomou imediatamente as suas precauções contra algum ataque e depois de ter mandado reconhecer a estrada de Nioac, conservava-se à cavalo, à frente da coluna, cercado pelo seu estado-maior.
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Notas de Referências
[2] NE – A Fortaleza de Humaitá, no Rio Paraguai, foi considerada o maior ponto de segurança e resistência do governo da República do Paraguai, na ocasião da Guerra. Só fora transposta por Forças Aliadas da Tríplice Aliança, Brasil, Argentina e Uruguai 19 de fevereiro de 1868.
[3] NE - Uma torrente é um córrego, curso de água com um caudal rápido e irregular, situado num terreno geralmente de forte inclinação. Depois de grandes chuvaradas.
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PARTE II – Os prisioneiros fugitivos do Paraguai

a) Os dez brasileiros[4] fugitivos do cativeiro de Horqueta, entre outros o filho e genro do Guia Lopes e os depoimentos, 13 de abril de 1867

Tocara-se a rebate em toda a linha e na retaguarda; mas dentro em pouco tivemos a agradável surpresa de ver de volta o nosso destacamento trazendo dez cavaleiros, eram fugitivos do Paraguai, eram brasileiros irmãos; pertenciam a famílias estimadas e muito conhecidas de proprietários dos arredores de Nioac, os Barbosas, os Ferreiras, os Lopes; escapavam às mãos de inimigos que supúnhamos implacáveis.

Por isso a notícia do aparecimento deles circulou com a rapidez do relâmpago em todo o acampamento e mesmo até Nioac. Homens e mulheres acudiam a vê-los com uma como ebriedade e a mor[5] parte em lágrimas. Sim, eram compatriotas! Rodeados, abraçados, acharam-se de repente diante do comandante que pôs-se a interrogá-los.

Disseram-lhe que tendo sido levados prisioneiros ao território paraguaio eles e as famílias quando o inimigo retirara, lá tinham sido distribuídos por vários lugares e mandados em maior número para Villa Horqueta, distante sete léguas de Concepcional; que lhes haviam dado lotes de terra para cultivarem, com a obrigação de darem aos coletores o quinto dos produtos, que não tinham sido muito incomodados até então, mas que tinham sabido recentemente que o governo da República, tendo falta de gente para o exército, tencionava recrutar todos os estrangeiros e até os prisioneiros e que tendo ao mesmo tempo a primeira notícia de que se aproximava um corpo de exército brasileiro, tinham resolvido afrontar tudo para reunirem-se a seus compatriotas, antes do que continuarem expostos ao risco de terem de combatê-los, e que as suas próprias famílias os haviam acoroçoado[6] em tal desígnio.

A 25 de Março, no mesmo dia dos nossos primeiros reconhecimentos diante da colônia, tinham apanhado bons cavalos paraguaios e conhecendo perfeitamente a sorte que os aguardava a si, se deixassem prender, tinham-se aventurado, caminhando por atalhos à noite de bosque em bosque, na direção da fronteira, tendo ali chegado, haviam atravessado o Apa com facilidade e deixando à direita a estrada da Colônia e subindo ao norte para a estância do Jardim, de lá desciam para reunirem-se a nós.

O coronel tomou então de parte na sua barraca o filho do guia Lopes, rapaz de boa presença que se parecia com o pai na inteligência e na reserva, querendo obter dele e do cunhado Barbosa as informações que pudessem dar acerca do estado do Paraguai, da sua força apreciável e dos seus meios de resistência, peculiarmente na fronteira vizinha. 

Os refugiados responderam que as fortificações sobre o Apa consistiam em simples paliçadas[7] de madeira ordinária apenas guarnecidas por cento e tantos homens em Bella Vista, sob o comando do major Martin Urbieta e que os outros fortes estavam ainda em piores condições de defesa; mas que o governo paraguaio, com as participações que recebera, comprometera-se a prover a tudo proximamente e a mandar reforços, ordenando que até que eles chegassem, se fossem retraindo ante o ataque e destruindo quanto não pudessem transportar. 

Acrescentaram que era geral o desânimo no interior da República, que de dia para dia acreditava-se menos no bom resultado da guerra, mas que não era menor a resolução de se defenderem até o último extremo e que o respeito pelo presidente — “El Supremo” — cujo nome não pronunciava sem descobrir-se, era sempre o mesmo. Nada puderam aliás dizer de certo acerca da sorte dos prisioneiros[8] do “Vapor Marquês de Olinda”, capturado antes da declaração de guerra.

Apenas tais notícias se espalharam no acampamento, não houve mais que um grito:

__ Marchemos para o Apa! 

O entusiasmo tocara ao auge e os mais prudentes deixaram-se arrastar pela excitação apaixonada dos grupos que se formavam por toda a parte.

Nesse momento anunciou-se a volta do Batalhão Nº. 17º que acompanhara o velho Lopes.
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Notas de Referências
[4] NE – Os dez prisioneiros brasileiros fugitivos foram: Francisco Felix; Francelino Rodrigues Soares; Gabriel Francisco Lopes; Gabriel Antonio Ferreira; Hypolito José Machado; Ignacio Gonçalves Barbosa; José Francisco Lopes Junior; José Leandro; Joaquim Felisardo Corrêa; Manoel Francisco Machado.
José Francisco Lopes Junior, era filho de José Francisco Lopes, o Guia Lopes e dona Maria Pereira ( 1ª Núpcias) fora casado com Maria Victoria Barbosa e tivera dois filhos de nomes Neves e Manoel.
Ignácio Gonçalves Barbosa, o genro, fora casado com Theotonia Maria Lopes, filha do Guia e Maria, falecida no cativeiro em Horqueta, tiveram dois filhos de nomes Zacharias e Antonio. Gabriel Francisco Lopes, era filho do primeiro casamento de Senhorinha Conceição Barbosa Lopes e Gabriel Francisco Lopes (este irmão do Guia Lopes e fundador da Fazenda Monjolinho, Retiro, falecido em 1849?) José Vicente Dalmolin, Guia Lopes da Laguna, Nossa Terra, Nossa Gente, Nossa História, volume I, 2017. 
[5] NE – Mor, mor é um adjetivo na língua portuguesa, considerado a forma abreviada de “maior” e bastante utilizado em palavras compostas: causa-mor, capitão-mor.
[6] NE – Encorajados. As famílias dos brasileiros prisioneiras encorajam os homens mais jovens a fugirem do cativeiro e virem ao encontro das Forças brasileiras e lutarem juntos.
[7] NE - Uma paliçada, em arquitetura militar, constitui-se numa obra exterior de defesa, constituída por um conjunto de estacas de madeira fincadas verticalmente no terreno, ligadas entre si, de modo a formarem uma estrutura firme. (https://pt.wikipedia.org/wiki/Paliçada)
[8] Vapor Marquês de Olinda, “Se trataba de un vapor de casco de madera impulsado por ruedas laterales. De escaso calado, lo que lo hacía apto para la navegación fluvial, tenía un desplazamiento de 180 toneladas y poseía un motor de 80 HP. Fue capturado por el gobierno paraguayo el 12 de noviembre de 1864 cuando subía el Río Paraguay llevando a bordo al coronel Frederico Carneiro de Campos, presidente de la Provincia de Mato Grosso. Este hecho fue considerado el hecho desencadenante de la Guerra del Paraguay. Coronel do Corpo de Engenheiros Frederico Carneiro de Campos, falecera em 3 de novembro de 1867, Fortaleza de Humaitá, Paraguai. Menor sorte não tivera também a tripulação”. http://guerradoparaguaimatogrossodosul.blogspot.com.br. Janeiro/2017.
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d) O Reencontro do Guia com o Filho José Francisco Lopes Junior

Assistir ao primeiro encontro do pai e do filho mais velho que lhe era restituído, foi desejo que a todos assaltou.

O nosso Guia soubera a fausta nova passando pelas sentinelas avançadas; vinha pálido, com os olhos úmidos, a ter com o filho que o esperou respeitoso com o chapéu na mão. O pai não se apeou, estendeu a mão direita trêmula que o filho beijou, deitou-lhe a bênção e seguiu sem proferir uma palavra.

Foi uma cena patriarcal e como todos os corações eram sensíveis às grandes cousas, olhávamos uns para os outros, como se uns aos outros perguntássemos se havia vergonha para soldados em deixarem correr algumas lágrimas.

Que emoção não sentiu esse velho tornando a ver o filho arrancada às mãos do inimigo! 

E ao mesmo tempo que dor vendo que a família perdera o seu último amparo!

Quando lhe falamos nisso, aspirou uma longa pitada e disse-nos:

__ “Deus é quem faz tudo”! “Deus assim o quis”!

__ “Fui feliz outrora, tive casa, família. Hoje durmo à chuva. Estou só. Como o que me dá a caridade”.

__ “Mas nós vamos encontrar casas em Bella Vista, respondemos-lhe; o senhor tem junto de si seu filho e seu genro. O senhor come em companhia de amigos e é o senhor quem lhes dá a carne do seu gado”.

__ “Meneou[9] a cabeça com sorriso melancólico:

__ “Nunca mais há de ser minha a fazenda[10] do Jardim”!

No entanto, o coronel, depois de entender-se com Barbosa acerca dos meios de ainda tirar gado dos campos de seu sogro, ordenou que se continuasse a marcha para a frente.
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Notas de Referências
[9] NE – O mesmo que acenar, abanar, balançar, agitar.
[10] NE – De fato, José Francisco Lopes, o Guia, falecera no dia 27 de maio de 1867, já em terras que lhe pertencia, mas não chegou à sede da Estância do Jardim.
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e) O último pedido do Guia Lopes

Pomos aqui termo a primeira parte da nossa narrativa, mas não deporemos a pena, sem lhe acrescentarmos algumas palavras acerca do velho Guia.

Incumbiu-nos, ao morrer, de recomendar-lhe a família ao governo da pátria. Como esquecer a palavra empenhada?

Morreu do cólera, assim como o filho mais velho e antes salvou centenas de existências, dirigindo a retirada da nossa coluna através de solidões que só ele conhecia; ainda depois de morto, como para continuar a intervenção benéfica estendida sobre nós, a sua estância do Jardim, que na agonia suprema os seus últimos olhares puderam ainda entrever de uma para outra margem do rio, o seu laranjal que era o seu orgulho, de alguma forma salvou-nos miraculosamente do cólera, pondo à nossa disposição os seus frutos inúmeros, socorro inesperado cujo valor supúnhamos pelo menos que ele exagerasse, quando nô-lo prometia.

A família perdeu quanto possuía e nada tem a esperar senão da proteção do governo, invocada por ele no último alento, a nação não o pomos em dúvida, reconhecerá a dívida sagrada contraída para com um dos seus mais dignos filhos, que finou-se[11] vítima da sua dedicação[12], homem tamanho segundo a ordem natural, tão nobre e tão bom sob a sua rudeza e cuja memória viverá no coração daqueles que o conheceram e que souberam apreciá-lo.

A sua viva e súbita amizade por quem escreve estas linhas, é um título honroso que nos perdoarão não omitir.
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[11] NE – Finar, mesmo que falecer, acabar, espirar. 
[12] Nota do Tradutor. O governo satisfez o pedido do autor, mandando pagar à viúva e filhos de Lopes quanto se lhe devia.
de Referências
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PARTE III
a. Transcrições de Documentos número 06, 07, 08 Expedidos na Colônia Militar de Miranda

Documento 06 
Reconhecimento pelos arredores do Apa, Relatório do Tenente-Coronel Antonio Enéas Gustavo Galvão, comandante do 17º Batalhão de Voluntários da Pátria

Nº. 17 - Quartel do Comando das Forças em Operações ao Sul da Província de Matto-Grosso na Colônia de Miranda, 14 de abril de 1867.

Ilmo. e Exmo. Sr. 

Tenho a honra de passar por cópia as mãos de V. Ex.ª a parte inclusa dada pelo Tenente Coronel de Comissão Antônio Enéas Gustavo Galvão, ao chegar da exploração que foi executar daqui a cinco léguas e meia o Batalhão de que ele é comandante.

Deus Guarde a V. Ex.ª . 

Ilmo. e Exmo. Sr. Albano de Souza Osorio, 
Vice-Presidente desta Província, 

Carlos de Moraes Camisão,
Coronel Comandante.
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Quartel do Comando do Batalhão Nº. 17º de Voluntário da Pátria. 
Acampamento na Colônia de Miranda, 12 de abril de 1867. 

Ilmo. e Exmo. Sr. 

Dando cumprimento a ordem de V. Ex.ª afim de com o Batalhão de meu comando fazer um reconhecimento do inimigo, pelas imediações do lugar denominado “Retiro”, marchei deste acampamento às onze e meia horas do dia 10 do corrente, acampando às seis da tarde na bocaina do referido lugar. Levantando acampamento ao romper do dia seguinte, cheguei ao Retiro às 10 horas e mandei fazer um reconhecimento pelo caminho novo aberto pelos Paraguaios, com a vanguarda reforçada pelos Índios, e em quanto esse reconhecimento se fazia conservei-me com o Batalhão em observação no referido ponto, onde se bifurcavam as duas estradas. Meia hora depois, recebendo comunicação de que o cantinho novo que se supunha existir não era mais que um desvio para o antigo que o ia encontrar na distância de uma e meia légua.

Marchei para esse lugar onde recebi comunicação da vanguarda de terem encontrado ali duas casas e avistado cinco soldados de Cavalaria, armados de lança e que se dirigiam para elas, os quais avistando a força, um retirou-se a todo galope, e os mais a passo, então apressando a marcha do Batalhão, coloquei-me neste ponto e tomei as providencias que exigia a topografia do lugar. 

Meia hora depois observou-se que um cavaleiro, pelo flanco esquerdo explorava a nossa retaguarda, que se achava apoiada no carrego que passa por de traz das mencionadas casas, onde me conservei, mandando distribuir à Força grande quantidade de aboboras, mandiocas e canas.

As cinco horas da tarde recebi comunicação de que outro cavaleiro explorava o nosso flanco direito. As seis passei revista ao Batalhão e não me considerando seguro neste lugar, por achar-me em uma campanha rasa, tendo apenas de distância em distância pequenos capões de mato, e achando-me a menos de légua do Apa, dei ordem para a retirada o que efetuou-se às sete da noite com todas as cautelas precisas, visto que reconhecia a facilidade de nos ser ela cortada e ter de atravessar em quadro grandes espaços, acrescendo ter-se findado o fornecimento de víveres, e acampei a uma hora da noite no lugar denominado Morro do Benfica. 

Hoje às 5 1/2 da manhã pus-me em marcha para este acampamento, e durante ela foi o Batalhão seguido no flanco esquerdo por três meios esquadrões da cavalaria inimiga, à vista da extrema retaguarda, sendo esta também observada por seis praças de cavalaria, e toda esta força acompanhou o Batalhão até 1/4 de légua antes deste acampamento, conforme as comunicações que tive do Capitão Delfino Rodrigues de Almeida Pires Flôres e do Alferes Comandante dela. 

É o que me cumpre participar a V. Ex.ª assegurando que a nossa Força é bem observada por frequentes patrulhas de cavalaria, existindo no retiro índios de um acampamento de que não posso precisar o número, sendo de crer que as duas casas a que acima me refiro constituem quartel de um esquadrão de cavalaria pela cavaleire contigua as mesmas casas. Não posso deixar de manifestar a V. Ex.ª a atividade e zelo pelo serviço que apresentou o Capitão da Guarda Nacional a que me referi, Delfino Rodrigues de Almeida Pires Flôres, adido ao Batalhão Nº. 21º de Infantaria de Linha que voluntariamente se ofereceu para marchar com o Batalhão de meu comando.

É um oficial bastante inteligente, prático no serviço de frente, e quase que posso afiançar a V. Ex.ª que valente pelo desafio que em pessoa dirigia a patrulha paraguaia, na ocasião em que os nossos soldados a pé pela falta de animais, corriam afim de ver-se os cercavam. 

Deus Guarde a V. Ex.ª . 

Ilmo. e Exmo. Sr. Coronel Carlos de Moraes Camisão, 
Comandante em Chefe destas Forças em Operações.

Antônio Enéas Gustavo Galvão. 
Tenente-Coronel em Comissão Comandante.

O Alferes Amaro Francisco de Moura,
Secretário Militar.
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Documento 07
Relatório da apresentação dos brasileiros prisioneiro fugitivos de Horqueta, Paraguai, entre eles, o filho, genro e sobrinho do Guia Lopes

Quartel do Comando das Forças em Operações ao Sul da Província de Matto-Grosso, na Colônia de Miranda, 13 de abril de 1867. 

Tenho a honra e prazer ele anunciar a V. Ex.ª que no dia 11 do corrente, apresentaram-se neste acampamento dez brasileiros, que se achavam prisioneiros desde Agosto do ano passado com numerosas famílias, no lugar chamado Capela Horcheta a 12 léguas da Villa Paraguaya da Conceição. Fugiram no dia 25 de março, escapando por este meio a ordem do Governo Republicano que chamava as armas todos os estrangeiros residentes no território Paraguaio e brasileiro, ali retidos, não só nas vizinhanças da Conceição como no Serro Leon, S. Joaquim e outros lugares. 

As notícias que me forneceram os fugitivos são de pouca importância e sobretudo certeza, visto como era absolutamente proibido aos naturais do país conversarem com eles em negócio relativo à guerra; entretanto, contam que já começa a fazer sentir os seus efeitos o desânimo que lavra geralmente na República e que os recursos dela já se acham quase de todo exauridos. Informam ainda que a fronteira do Apa está em alvoroço com a aproximação destas Forças havendo já o Comandante do Forte de Bella Vista mandado pedir ao Presidente Lopez reforço para se opor ao ataque da Força brasileira que eles supõem ser muito numerosa

À vista, pois, destas notícias que confirmam a vantagem que eu acreditava tirar, trazendo as forças para esta fronteira donde ameaçava o território vizinho com o receio de uma invasão, tenciono brevemente dar ordem de marcha dirigindo-me incontinente sobre o Apa, afim de lá operar, conforme o permitirem os recursos de que disponho, e a força contrária, lamentando-me achar desprovido de todo de Cavalaria, um dos elementos mais necessários para fazer a guerra nesses campos vastos e descobertos. 

A chegada dos Brasileiros montados em cavalos que trouxeram do Paraguai veio por ora remover a dificuldade em que eu me via para o provisionamento da força, a tal ponto chegara a falta de cavalhada, contudo com fé viva na Providência Divina, a qual em sua Eterna Justiça protege a causa do Brasil, confiado na coragem que sabe em honra a dignidade de sua Pátria, desenvolver no conflito o Soldado Brasileiro e impeli-lo pelo incentivo de levar as armas pelo Império, como reação a injusta invasão do Distrito de Miranda, até o Apa, dirijo-me aos pontos extremos da Província de Matto-Grosso procurando quiçá entrar no território da República. 

Remeto a relação inclusa dos nomes dos fugitivos brasileiros aproveitando a ocasião para significar a V. Ex.ª . os meus protestos de alta consideração. 

Deus Guarde a V. Ex.ª . 

Ilmo. e Exmo. Sr. Albano de Souza Ozorio, 
Vice-Presidente desta Província. 

Carlos de Moraes Camisão, 
Coronel Comandante.

Relação nominal dos brasileiros prisioneiro e fugitivos:

Francisco Felix
Francelino Rodrigues Soares
Gabriel Francisco Lopes (Sobrinho do Guia)
Gabriel Antonio Ferreira
Hypolito José Machado
Ignacio Gonçalves Barbosa (Genro do Guia Lopes)
José Francisco Lopes Junior (Filho do Guia Lopes – José Francisco Lopes)
José Leandro
Joaquim Felisardo Corrêa
Manoel Francisco Machado
__________

Documento 08 
Proclamação da Ordem do dia decisão de avançar até o Rio Apa

Quartel do Comando das Forças em Operações ao Sul da Província de Matto-Grosso na Colônia de Miranda, 14 de abril de 1867.

ORDEM DO DIA N. 18

Camaradas, amanhã seguiremos para o Apa! 

Nas margens daquela divisa do território Brasileiro flutuará pela vez primeira o Pavilhão Nacional! 

Seja a sua aparição saudada pelo clamor uníssono dos peitos patriotas, mantida constância e Coragem, sustentada pela dignidade do militar.

Os Exércitos do Sul alcançando a glória que Deus distribui aos homens inflamados pelo amor da Pátria, traçarão a linha que deveis seguir.

Cercando a Bandeira, emblema de nossa civilização, de nossa Constituição Política, de nossa honra, levantai-a tão alto que o Brasil em peso nos atire as bênçãos de reconhecimento e que o mundo declare haveis bem merecido ele vosso pais. 

Confieis sempre em vós, vossos chefes, na Estrela do Império. O Deus das Batalhas nos

Protegerá e o Anjo da Vitória, adejando sobre vossas frontes, arrebatará à imortalidade os mártires, coroando aos vitoriosos. 

Carlos de Moraes Camisão, 
Coronel Comandante 

O Alferes Amaro Francisco de Moura,
Secretário Militar.


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