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7 de maio de 2017

A CAMINHO DO APA, LAGUNA, PARAGUAI - 05 ENTRE NIOAC E A COLÔNIA MILITAR DE MIRANDA

CAPITULO IV

AS FORÇAS EM OPERAÇÕES NO SUL DA PROVÍNCIA DE MATO GROSSO

A Marcha entre a povoação de Nioac e  a Colônia Militar de Miranda 25 de fevereiro a 25 de março de 1867
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Índice Geral

PARTE I
1. A marcha entre Nioac e a Colônia Militar de Miranda
Vista Panorâmica atual da estrada antiga que dava acesso as Colônias Militares de Miranda, Dourados, Estancia do Jardim, Forte de Bella Vista, Laguna no Paraguai e da BR-419/060 permite acesso a Guia Lopes da Laguna, Bonito, Jardim, Bela Vista, Porto Murtinho, Caracol. Adaptado do Google Earth Pro 2017. José Vicente Dalmolin.

a) Pouso na margem do rio Nioac

A coluna pôs-se em movimento no dia 25 de fevereiro e foi acampar a uma légua da povoação, à margem do rio Nioac. Apenas pudemos, fomos visitar o comandante; tinha a tenda levantada em um outeiro[1] pedregoso, meio abrigada por palmeiras que tornavam o lugar agradável.

Estava agitado: já faltava gado para o rancho da tarde. Disse-nos:

Vista Panorâmica atual do Passo no Rio Nioac. Localização atual direção à nascente, fundos do 9º GAC, Bairro Baía. Estrada primitiva. Ainda tem acesso ao Município de Guia Lopes da Laguna. Esta via foi substituída a partir da década de 1940. Atual BR-419/060. Adaptado do Google Earth Pro 2017. José Vicente Dalmolin. 

__ “Iremos até a colônia de Miranda”; depois, voltando-se para o velho Lopes, mostrou-se impaciente por ver o cumprimento das suas promessas, repetindo-lhe muitas vezes que apenas contava com o gado da sua estância do Jardim. O guia, quase sem lhe responder, saiu da tenda e partiu-se.
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Notas de Referências
[1] NE – O mesmo que elevação; colina; pequena saliência.
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b) Rio Canindé e Desbarrancado

A 26 estávamos na passagem do rio Canindé[2].

No dia 27 de março de 1867 cruzando pelo rio Desbarrancado[3].
Vista Panorâmica sobre o “Rio Canindé”, a atual ponte e estrada. Acesso a Fazenda Jardim do Guia Lopes, Colônia de Miranda. Localizado nas regiões limítrofes entre os Município de Guia Lopes, Maracaju e Nioaque. Os episódios mais marcantes do conflito da Guerra, ocorreram em 1867, conforme os registros de Visconde de Taunay durante a marcha dos retirantes da Laguna. Adaptado do Google Earth Pro 2016. José Vicente Dalmolin.

Ao chegarmos a este sítio, em que se havia debandado o corpo do tenente-coronel Dias, achamo-nos diante de uma cruz na qual estava, a inscrição seguinte:

__ “Aqui murió el soldado de caballeria Eusebio Gama en ocasión[4] de guerra. — Enero 1 — 1865”. (Sic).

Perto estava um crânio com dois profundos golpes de espada, glorioso resto do brasileiro Gabriel Barbosa[5], como soubemo-lo dentro em pouco. Era dessa mesma força de Antônio Dias, que acabamos de dizer que se dispersara ao aproximarem-se os paraguaios; Barbosa, perseguido por cavaleiros, sentindo afrouxares-lhe sob as pernas o animal cuja rapidez era a sua única probabilidade de salvação, apeou-se para vender caro a vida, e só no meio da estrada, com a espada em uma mão e uma pistola na outra, matou o primeiro que se lhe acercou (aquele sobre quem estava plantada a cruz) e depois de haver ferido a outros, sucumbiu ao número; era dele o crânio que viramos e que um dos nossos oficiais teve o cuidado de apanhar.
Vista Parcial do “Rio Desbarrancado”, no atual Município de Guia Lopes da Laguna, Mato Grosso do Sul, Brasil, a antiga estrada de acesso da época, por onde passaram as Tropas Paraguaia na invasão de 1864; a resistência e confronto das tropas Brasileiras sob o comando do Capitão Pedro José Rufino e do Tenente Coronel Dias da Silva. Também por este caminho passaram as Tropas brasileiras sob o comando do Coronel Camisão em 1867. Deste ponto seguia para a travessia de outros rios o Feio, Santo Antônio, Canindé e Nioaque. Acesso para chegar a Nioaque ou as Colônias Militar de Miranda, Dourados ou a fronteira da República do Paraguai. Adaptado do Google Earth Pro 2016. José Vicente Dalmolin.

Alguma distância, daí, mas pelo mesmo tempo, o tenente Antônio João, em Dourados, com um punhado de soldados, protestava também contra a invasão estrangeira à custa do seu sangue heroicamente derramado.

A expedição demorou-se dois dias nesse lugar, o dia 28 de fevereiro e o dia 1º de março. 
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Notas de Referências
[2] NE- O rio Canindé afluente pela margem esquerda, do rio Nioaque no município de Nioaque. 
[3] NE – Rio Desbarrancado, afluente, pela margem direita, do rio Santo Antônio no município de Guia Lopes da Laguna. Suas nascentes se localizam na borda ocidental da serra de Maracaju. De acordo com a História, a estrada que interligava Nioac as Colônias Militares de Miranda e dos Dourados, além de acesso a fronteira com as localidades de Concepción e Bella Vista no território da República do Paraguai, cruzavam estes rios: Canindé, Desbarrancado, Feio e Santo Antônio, entre outros. Consequentemente na ocasião da invasão pelo Paraguai, as tropas do Comado do Tenente Coronel Dias da Silva e Capitão Pedro José Rufino apresentaram resistência as Forças sob o comando do Coronel Resquin em 31 de dezembro de 1864. 
[4] NE – Palavra original é agzion. Por não encontramos significação em espanhol atual, substituímos por ocasión, o mesmo para di para de, empregado dentro do contexto, que é a referência do tradutor do francês para o português. A frase original “Aqui murió el soldado de cabaleria Eusebio Gama en agzion di guerra. — Ennero 1 — 1865”. (Sic). Tradução “Aqui morreu o soldado de cavalaria Eusebio Gama em ocasião de guerra. 1º de janeiro de 1865”. 
[5] Segundo Consta o nome deste Barbosa morto em, combate era Manuel Gonçalves Barbosa, filho de Inacio Gonçalves Barbosa, fundador da Fazenda Urumbeva, terras desta dera origem a povoação de Nioac. José Barbosa Rodrigues escreveu “Apenas duas Ossadas”. Acy Vaz Guimaraes. Município de Mato Grosso do Sul. Guia Lopes da Laguna.
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c) No Rio Feio

No dia 2 marchou até ao rio Feio[6], corrente vizinha onde passou o dia 3 em razão do mau tempo.
Vista Parcial do Rio Feio, no atual Município de Guia Lopes da Laguna, Mato Grosso do Sul, Brasil, a antiga estrada de acesso da época, por onde passaram as Tropas Paraguaia na invasão de 1864; a resistência e confronto das tropas Brasileiras sob o comando do Capitão Pedro José Rufino e do Tenente Coronel Dias da Silva. Também por este caminho passaram as Tropas brasileiras sob o comando do Coronel Camisão em 1867. Adaptado do Google Earth Pro 2016. José Vicente Dalmolin. 

Espessa mata cobre as margens dessa corrente, que é afluente do Santo Antônio[7], assim como o Santo Antônio de Miranda[8].

Fora ali que a 31 de dezembro de 1864 o capitão Pedro José Rufino, tendo consigo apenas dez ou doze homens, fizera valorosamente frente aos paraguaios e disputara-lhes por largo tempo a passagem, dissimulando o pequeno número dos seus, com tanta felicidade quanta intrepidez. Realizara-se também ali uma conferência entre o tenente-coronel Antônio Dias e o comandante da vanguarda paraguaia.
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Notas de Referências
[6] NE – Rio Feio, afluente, pela margem esquerda, do rio Santo Antônio, no município de Guia Lopes da Laguna. 
[7] NE – No texto Original está como Rio Desbarrancado. De acordo com a Rede Hidrografia atual, é o Santo Antônio. 
[8] NE – No original está rio Nioac. Na verdade, o Rio Santo Antônio, Localizado no Município a atual da Guia Lopes da Laguna, é afluente do Rio Miranda e não do rio Nioaque. Desemboca nas proximidades de Limites com o Município de Jardim, na chamada ponte velha. Construída em 1937/38 pela então Companhia de Sapadores de Aquidauana.
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d) A primeira remessa de gado

A 3 de março Francisco Lopes voltou da sua propriedade do Jardim, trazendo-nos mais ou menos 250 cabeças de gado e assim aumentou naturalmente a grande confiança que já tínhamos nele e em sua palavra. Apenas de volta, pôs-se a procura e reconheceu os vestígios de uns vinte cavaleiros que se adiantaram até ali, poucos dias antes.


PARTE II
2. A Estada na Colônia Militar de Miranda

a) A Chegada e as Condições

No dia 4, à uma hora da tarde ocupamos o lugar onde existira a colônia de Miranda[9], restavam apenas alguns vestígios de construções incendiadas.

A posição da colônia é excelente quanto à defensiva, cercada por dois amplos cordões de mata em semicírculo, tendo na frente e atrás uma torrente[10] larga e profunda, cingida ainda por uma zona inundada de cerca de dez braças, ali uma surpresa é quase impossível.

As condições higiênicas do lugar não são piores. O fundo coberto de água que o rio costeia, é de argila salina e nenhum vapor palustre daí se exala. O Miranda, batido em cachoeiras numerosas, rola águas cristalinas como as do seu afluente o rio dos Velhos[11], que nasce também da vertente ocidental da cadeia de Maracaju, as encostas opostas derramam para leste o Dourados[12] em vários braços que outras torrentes vão engrossar.
O coronel Camisão mandou para logo explorar todos os pontos que se ligavam à nossa posição, ordenou em todas as direções entradas pelas matas e ocupou as estradas do Apa e da colônia com piquetes, ao mesmo tempo que as avenidas da frente e da retaguarda por numerosos postos.
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Notas de Referências
[9] NE – A Colônia Militar de Miranda, atualmente está ocupada por fazendas de criação de gado, área particular. Não há nenhum monumento histórico. Situada no Município de Guia Lopes da Laguna-MS. NA - A 12 léguas S. SO. de Nioac. 
[10] NE – Torrentes, é o mesmo que arroio; riacho; córrego. A Colônia Militar de Miranda fora construída nas proximidades do Córrego Atoleiro, este afluente do Rio Miranda. 
[11] NE – Rio das Velhas, afluente margem esquerda do Rio Miranda, atualmente localizado no Município de Jardim – MS. 
[12] NE Rio Dourados, ´[e um dos afluentes pela margem direita, do rio Brilhante, limite entre os municípios de Ponta Porã e Antônio João, Dourados e Ponta Porã, Dourados e Laguna Carapã, Dourados e Caarapó, Fátima do Sul e Caarapó, Dourados e Fátima do Sul e Dourados e Deodápolis. Bacia do rio Paraná. Extensão: 370 km, dos quais 150 navegáveis. Nasce na serra de Maracaju, nas proximidades da cidade de Antônio João. Foi conhecido por muito tempo como rio dos Dourados. História. Conforme Campestrini, nas suas nascentes foi instalada, em 1861, a Colônia Militar do Dourados (na época, dos Dourados), destruída, no dia 29 de dezembro de 1864, pela Coluna Urbieta (na Guerra da Tríplice Aliança), quando foi morto, pelos invasores, o tenente Antônio João Ribeiro. Enciclopédia das Águas de MS. IHGMS. 2014.
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b) Reconhecimento das proximidades

O que se deveria fazer era correr às fortificações paraguaias e tomá-las de assalto. Na primeira confusão de semelhante surpresa, o Norte da República poderia ter sido devastado antes que o governo em Assunção soubesse da nossa marcha; mas sucedeu coisa muito diversa; o inimigo teve tempo de conhecer a direção e o alcance da empresa.

Um piquete de cavalaria paraguaia batia todos aqueles sítios de tempos a tempos e eram deles os vestígios que o nosso guia reconhecera; supôs-se que o podíamos surpreender. 

Postaram-se duas emboscadas, uma ao pé de uma colina a que chamamos Benfica, do nome de um alferes que foi designado para ali comandar, a outra sobre o rio dos Velhos. E Lopes, depois de haver tudo disposto com a sua habitual sagacidade, afim de que nenhum inimigo pudesse escapar, seguira com dois soldados para ir a venturosamente reconhecer a posição do inimigo do lado da colônia de Dourados. Vimo-lo mais tarde voltar carregado de objetos que tomara como troféu e de alguns víveres deixados nos ranchos desertos. Quanto a nós, imóveis, fazíamos calar os nossos próprios clarins e as nossas músicas, com medo de revelarmos a nossa presença.

Extrema era a impaciência no meio de nós e os nossos dias agitados por mil conjecturas passavam-se no desejo de alguma mensagem, de alguma nova, fosse ela qual fosse, preferível à febre da espera.

A do alferes Benfica no seu posto excedia ainda por certo a nossa no acampamento, mandou perguntar ao comandante se não conviria para atrair a ronda inimiga, pôr fogo a capoeira dos campos que cercam Miranda. A ideia carecia sem dúvida de ser submetida a maduro exame, foi todavia, acolhida com sofreguidão[13] e imediatamente posta por obra pelo coronel. Não foi pequena a nossa admiração ao ver o incêndio propagar-se na planície.

Soubemos depois que a força inimiga de Bella Vista[14] sobre o Apa, ficara para logo de sobreaviso. Presumiram que se passava do nosso lado alguma coisa extraordinária e o comandante da fortaleza apressou-se em mandar comunicações à Assunção. Cavaleiros partiram à toda a brida[15]; um sinal os precedia, outro incêndio das capoeiras, mas com melhor justificação que o nosso.

Vimos formarem-se na fronteira bastos rolos de vapores; tomamo-los a princípio por algum belo fenômeno natural, alguma nuvem tempestuosa iluminada pelos raios do sol poente; aos olhos, porém, do velho Lopes, que então voltava da sua expedição a Dourados, não se iludira um momento:

__ “Os paraguaios, disse, dão sinal da nossa chegada”!

Tal foi o resultado de um estratagema que nem sequer teve em compensação a vantagem, daí em diante inútil, de atrair os exploradores paraguaios, como se tivera em mira. Só a 12 de março uma das nossas sentinelas percebeu-os ao longe e fora do nosso alcance, mas já o comandante mandara voltar a gente das emboscadas.
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Notas de Referências
[13] NE – Impaciência; pressa. 
[14] NE – Atual Bella Vista Norte, no Paraguai. NA - 12 léguas a SO. da colônia de Miranda. 
[15] NE – Brida, termo originário do francês, bride, freio. Alça, corda que liga as mão do condutor, cavaleiro ao freio, na montaria à cavalo. Serve como rédeas para guiar.
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c) O segundo lote de gado conduzido por Lopes

Semelhante incoerência a todos impressionou. A confiança dos soldados em seu chefe estava já abalada pelas vicissitudes de demora e precipitação das providências que o tinham visto tomar. A fome estava sempre iminente. Um Segundo rebanho[16] de duzentas cabeças que Lopes trouxera ainda das suas terras, estava quase acabado; nenhuma nova remessa era anunciada e a comissão de fornecimentos participara, em uma exposição datada de Nioac, que não se achava em circunstâncias de prover daí em diante ao fornecimento de gado.
Vista Panorâmica atual onde fora a Colônia Militar de Miranda até 1867. Imagem adaptada por José Vicente Dalmolin. Imagem de Satélite. Google Earth Pro. 2017.
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Notas de Referências
[16] NE – A primeira remessa de gado foi de aproximadamente 250 cabeças e a segunda de 200 aproximadamente.
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d) Na Colônia Militar de Miranda as indecisões quanto a ofensiva para a fronteira com o Paraguai

Nessa extremidade as incertezas do Coronel manifestaram-se com mais frequência; deu mesmo a entender a necessidade, a que podia achar-se reduzido, de retroceder à Nioac e abandonar momentaneamente os seus projetos de operações ofensivas. 

Pretendia fazer notar que a ideia nunca fora favoravelmente acolhida.

Quis em todo o caso por a sua responsabilidade a coberto, por meio de um documento oficial que pudesse produzir perante o governo assim como perante a opinião pública e dirigiu a 23 de março um ofício ao presidente da comissão de engenheiros, pedindo-lhe que convocasse os membros da comissão, para deliberarem acerca da possibilidade de um movimento agressivo e acerca dos meios de levá-lo a efeito.

Na tarde desse mesmo dia, por um contraste cuja impressão perdurará sempre em nossa memória, foi a luz do sol poente que enchia o espaço de paz e de alegria, que reuniu-se esse conselho pejado[17] de tantos infortúnios, solene ao começo, mas cuja animação conscienciosa não tardou que degenerasse em violências.
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Notas de Referências
[17] NE – O que tem pejo, vergonha; envergonhado, tímido; embaraçar-se; envergonhar-se.
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e) A avaliação da Comissão sobre a situação da Forças

Três dos membros da comissão empenharam-se em pintar, por diversas vezes, a posição do corpo de exército tal qual era na realidade: 
  •  a insuficiência dos víveres[18];
  •  a falta absoluta de meios de transporte; 
  •  nenhuma cavalaria;
  •  poucas munições; 
  •  sem reforços nem recursos a esperar;
  •  punhado de homens em terra inimiga; 
Daí a eventualidade infalivelmente próxima de uma retirada a executarem sem dados de antemão estudados e em condições em que o cometimento só pode acabar em um desastre, com a deplorável consequência de chamar de novo ao território brasileiro a ocupação paraguaia, seguida de todos os seus horrores.

Sobeja[19] razão tinham os que assim pensavam, mas dois dos colegas encarando a questão sob ponto de vista diferente e buscando argumentos em esfera mais elevada, entendiam que o corpo de exército tinha missão, que devia cumprir a todo o custo, que a sua marcha pelo Norte do território paraguaio era absolutamente indispensável no plano do conjunto da guerra, que essa diversão seria talvez decisiva em favor do ataque ao Sul, que a coluna era sem dúvida demasiado fraca e podia sucumbir, mas utilmente e com glória e que ao menos dir-se-ia que era composta de generosos filhos do Brasil.

Éramos todos moços, tais ideias, tais sentimentos invocados como opiniões em sentidos contrários, trouxeram troca de palavras altivas e afinal personalidades.

O tenente-coronel Juvêncio, chefe da comissão, conservara-se até então calado, sem poder, no entanto dominar completamente a emoção que sentira por vezes.

Do seu voto, que era preponderante, ia depender o fim da discussão; resumiu o seu parecer, colocando-o excepcionalmente no terreno positivo:

__ “O Corpo não podia ir por diante sem víveres; já não havia gado para alimentá-lo”. 

Nesse mesmo instante sobreveio, um desses incidentes que se intrometem na combinação das cousas humanas para determinar-lhes o curso.
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Notas de Referências
[18] NE – O mesmo que mantimentos, gêneros, provimentos, abastecimentos. 
[19] NE – O mesmo que abunda, sobra, superabunda.
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f) A terceira remessa de gado da Estância do Jardim

Uma ponta de gado[20] que o infatigável Lopes, a instâncias do nosso comandante, tinha ainda, ido reunir nos campos da sua estância do Jardim e que tocava para o acampamento, nele entrava não sem tumulto e respondendo o mugido dos animais aos brados dos peões e vaqueiros.

Tudo ficou para logo decidido, qual outrora em Roma viram-se expedições militares suspensas ou precipitadas pelos sons abafados das vítimas ou pelo grito dos frangões sagrados. 

O presidente do conselho levantou-se e voltando-se para o secretário incumbido de lavrar a ata da sessão, o próprio autor desta narrativa encarregou-o de comunicar ao comandante que a comissão reconhecia unanimemente a possibilidade de marchar-se para a fronteira e apressava-se a oferecer para levá-lo ao cabo todo o concurso da sua boa vontade.

Em seguida exclamou como homem que se consagra ao sacrifício[21]:

__ “Deixarei uma viúva e seis órfãos; receberão a herança de um nome honrado”. 

Assim encerrou-se esse conselho, sobre o qual estava fixa a atenção de todos os oficiais e cujo resultado a todos surpreendeu, mas, a ninguém tanto como ao próprio comandante; pois via-se arrastado pelo obstáculo que supusera levantar entre si e os perigos do seu primeiro projeto. O sentimento da dignidade pessoal, poderoso desde que nele se despertava, preservou-o, no entanto, de dar outras mostras da sua impressão além das inópias e involuntárias; empenhou-se daí em diante a fazer bem o que não podia deixar de ser feito.
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Notas de Referências
[20] NE – Segundo as narrativas do autor, entende-se que esta foi a terceira remessa de gado trazida da Estancia de José Francisco Lopes, e que os paraguaios não conseguiram localizar, entretanto não específica a quantidade. 
[21] NE – Palavras do Tenente-Coronel Juvêncio. Assim cumpriu a “profecia” Falecera em 29 de maio de 1867. Hoje seu nome está estampado em monumentos, ruas, escolas, instituições militares por todo o Brasil.
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g) Transcrições de Documento número 05, Expedido na Colônia Militar de Miranda pelo Coronel Camisão

Documento 05

Partida de Nioac e a chegada na Colônia Militar de Miranda

Quartel do Comando das Forças em Operações ao Sul da Província de Matto-Grosso, na Colônia de Miranda, 10 de abril de 1867

Como tive a honra de comunicar a V. Exc.ª. saí do ponto de Nioac no dia 25 de fevereiro último, e com 8 dias de marcha cheguei ao local da antiga Colônia de Miranda no dia 4 de março próximo passado, formando ali acampamento como era minha resolução. 

Os vestígios que na chegada das forças foram encontrados de ser este lugar rondado ainda por partidas de cavalaria inimiga, me obrigaram a ter em vista as condições da mais completa segurança e atendendo a elas aproveitei a disposição topográfica para assegurar-me uma Boa posição defensiva, em que pudesse esperar qualquer agressão. 

O acampamento atual na opinião da comissão de Engenheiros que foi consultada a respeito, oferece garantias para uma boa defesa, o que é de suma importância na curta distância a que nos achamos de um inimigo audaz e de posse de cavalaria bem montada.

Na realidade, poucos dias depois da chegada foi este ponto visitado por uma ronda de Cavalaria Paraguaia, a qual apenas reconheceu a presença de nossas forças retirou-se com grande ligeireza, sem que houvesse possibilidade de prossegui-la, pois que todo o 1 º Corpo de Caçadores a Cavalo que aqui tenho, acha-se de pé, e existe a maior dificuldade na obtenção de cavalos, mesmo para o costeio do gado preciso para a alimentação.

Nos dias subsequentes fiz explorar o ponto de Dourados, situado a doze léguas deste acampamento e esse reconhecimento deu a conhecer que aquele local havia sido de a muito abandonado, existindo, porém ainda ali vários objetos e víveres dos quais alguns foram trazidos pelos nossos soldados. 

Em seguida mandei o Chefe da Comissão de Engenheiros explorar o terreno a algumas léguas em derredor deste acampamento, o que na realidade efetuou com dois de seus Ajudantes. 

Como previ e de a muito havia comunicado a V. Exc.ª. as maiores dificuldades surgem quanto ao provisionamento de gado. A escassez se vai tornando cada vez mais sensível e seu conseguimento cada vez mais custoso, atendendo não só a pouca quantidade de rezes e está espalhada em larga zona, como a impossibilidade em obter cavalos para substituir aqueles que a peste mata ou inabilita do trabalho. 

Acho-me, pois, nas circunstâncias mais críticas, vendo iminente o momento em que eu seja de todo constrangido pela necessidade a modificar meus planos, abandonando os projetos que havia delineado.

Mantendo-me, com tudo, neste ponto, empregando os maiores esforços para que sejam ainda providas estas forças por algum tempo, pois que reconheço que mesmo acampadas, atuam elas aqui favoravelmente sobre o moral do inimigo, obrigando-o a vigilância cuidadosa em sua fronteira septentrional e ameaçando a República com os receios de uma invasão.

Para o conseguimento de um resultado que pode ter repercussão imensa nos acontecimentos futuros, influindo eficazmente a que se quebrante a resistência que experimentam os Exércitos do império no Sul do Paraguai, desenvolverei o esforço compatível com o que se pode esperar da boa vontade e patriotismo. 

Deus Guarde a V. Exc.ª. 

Ilmo. e Exmo. Sr. Albano de Souza Ozorio, 
Vice-presidente desta Província. 

Carlos de Moraes Camisão, 
Coronel Comandante.



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