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21 de maio de 2017

O CAMINHO EM RETIRADA DA LAGUNA - 10 - MARCHAS E COMBATES 30, 31 DE MAIO 01, 02 DE JUNHO 1867

CAPÍTULO XIX

AS FORÇAS EM OPERAÇÕES NO SUL DA PROVÍNCIA DE MATO GROSSO

A marcha da Retirada prossegue: novo comandante. Passagem do rio Miranda. A Fazenda Jardim. Salvando os canhões. Rufino o novo guia. Reencontro com a Cavalaria Paraguaia. Caminho da Fazenda Jardim ao Rio Canindé. Estradas abertas e conhecidas. Dias 30, 31 de maio e 1, 2 de junho 1867.






Parte I

Atingindo enfim a Fazenda Jardim



1- Renasce a confiança e restabelece a disciplina sob o novo comando



Apenas investido no comando, o major José Thomaz Gonçalves publicou uma ordem do dia[1], na qual, apelando para a coragem e para os sentimentos de honra de cada um para conjurar o perigo de todos, apontava como único meio de salvação uma marcha rápida sobre Nioac com todo o risco e por todo o preço. O tom animado dessa proclamação produziu um movimento de excitação moral, capaz de restaurar ainda o estado sanitário que ia melhorando, e fez com que sucedesse ao desfalecimento dos ânimos o auspicioso princípio do costumado ardor do novo chefe. As cornetas, recomeçando a dar os sinais de ordem às horas determinadas, tocaram a recolher. 

O corneteiro e a corneta em novo ânimo, sinalizam o toque da nova ordem militar e da disciplina entre os comandos e comandados.


Havia muitos dias que já as não ouvíamos, que apenas uma corneta do quartel-general marcava tristemente a sucessão das horas. Mas o que principalmente causou viva e agradável surpresa foi, da margem oposta do rio, o som dos clarins do corpo de caçadores que se puseram a responder-nos. A regra militar velava pois ainda sobre nós! O isolamento cessara! A distribuição das nossas forças parecia havê-las duplicado, e o prestígio da disciplina restabelecia por toda a parte a confiança.

Uma mudança de chefe desperta sempre a atenção geral e dela se apossa poderosamente à espera da primeira manifestação sensível. Aquilo que a ordem do dia do novo comandante José Thomaz Gonçalves não dissera, disseram-no os seus atos. Tornara-se a personificação da ordem, era seu o órgão. Fez sentir a força que ela tinha alguns recalcitrantes que se atreveram a pô-lo a prova, chegando a desobedecer-lhe. Não tardou a repressão cousa que para as turbas é prova da legitimidade do poder.

Estávamos no dia 30 de maio 1867, fora dada a ordem de transpor o rio e tudo estava de antemão disposto. O vaivém foi colocado e regularizado. Soldados que tinham atravessado isoladamente sem autorização, foram revocados da outra margem e reintegrados nos corpos a que pertenciam, depois de severa admoestação por uma falta que em tempo de guerra e diante do inimigo, transforma-se facilmente, em crime contra a segurança geral. Um sargento, que faltara ao seu dever nessa ocasião, foi imediatamente rebaixado do posto.
Vista do rio Miranda, margem esquerda.
Na direção à esquerda da foto, as águas correm para o rio Paraguai.
10ª Marcha Cívico-Cultural da Retirada da Laguna. Imagem José Vicente Dalmolin/2014

Esta demonstração de firmeza foi bastante para reparar o dano que os quatro dias[2] de moléstia do comandante tinham causado à disciplina.
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Notas de Referências:


[1] NE Ler cópia incluída em anexo a este Capítulo
[2] NE – Dias 26,27,28,29 de maio de 1867.
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a- A transição de autoridade entre Camisão, Falecido e Gonçalves, novo comando

Pois já vimos que o próprio coronel Camisão dera sempre muito apreço a manutenção dela, mas não possuía, como o seu sucessor. O nosso novo chefe, tinha a arte de tornar o dever fácil e agradável, por exterioridades comunicativas. 

O comandante Camisão apesar de ser estimado e respeitado pela força que via nele um militar leal, vigilante, dedicado aos interesses da justiça, da humanidade, como o seu gênio concentrado lhe desse, peculiarmente nos últimos tempos, aspecto de contínuo sofrimento, esse seu mesmo gênio chegara a fazer crer que o infortúnio pesava sobre a sua cabeça, cousa que ele próprio parecia recear, e nada é mais funesto ao crédito da autoridade. Seja esta a última menção que façamos de tão dolorosa existência!

2- A Forças Expedicionária inicia a transposição do Rio Miranda

Quando ao sinal dado começou a passagem que, conforme dissemos, fora determinada, não foi sem interesse o espetáculo que se ofereceu aos nossos olhos, tinha-se começado por verificar por meio de bons nadadores a força de resistência do cabo sob pesos assaz consideráveis.
Imagem: Panorama de contextualização geográfica e histórica atual. Adaptado do Google Earth Pro 2016. José Vicente Dalmolin

Então, homens em número sempre crescente, mas calculado, suspendiam-se a ele e iam mudando as mãos e ao passo que os corpos eram completamente empuxados pela rapidez da água na superfície, adiantavam-se lentamente e acabavam, não sem dificuldade e perigo, por alcançar a margem oposta, foi assim que passou todo o Nº. 20º Batalhão. 

Após ele, vimos os próprios coléricos tentar passar e não só conseguirem-no, como saírem já mais fortes e alguns quase inteiramente curados.

É verdade que outros ali acharam a morte. A princípio procurou-se com boas palavras dissuadi-los. Mas, testemunhas do abandono ainda tão recente dos doentes, não lhes saía da mente a previsão de igual sorte. Não houve consideração que os resolvesse a passarem em último logar. Teria sido preciso empregar a força para detê-los. Foi prudente e justo deixá-los correr um perigo, que imploravam como uma mercê[3].

Entretanto, as armas e os cartuchos tinham sido transportados em pelotas, assim como os oficiais e alguns doentes quase agonizantes, a quem esse favor não pudera ter sido recusado no estado de convulsiva agitação em que os punha a rapidez dos nossos preparativos e principalmente a partida dos outros coléricos que tinham tido força bastante para se agarrarem ao cabo.
Outro tipo de Pelota, feita de couro bovino. Material rústico. Destinada para o transporte de materiais que não podiam ser molhados tanto pelas chuvas, quanto na passagem de cursos de águas, neste contexto, no rio Miranda. Utilizado no acondicionamento de roupas, alimentos, munições, documentos, entre outros. Material apresentado na 11ª Jornada Cultural da Retirada da Laguna, 2015, nos acampamentos na Fazenda Jardim. José Vicente Dalmolin
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Notas de Referências:
[3] NE – Implorar favor, benefício, graça.
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3- A passagem das quatro peças de canhão da Arma da Artilharia

O comandante, achando que tinha já força suficiente na outra margem do rio, resolveu mandar passar no dia seguinte as nossas quatro peças de Artilharia. Estas haviam-se tornado para nós causa de viva inquietação no meio de todas as nossas calamidades. Deixá-las como troféu ao inimigo, não era admissível. Já o coronel Camisão reunira um conselho em que se tratará do assunto e existia uma ata autorizando o comandante, caso fosse necessário, a fazê-las desaparecer no leito de algum rio, na maior profundidade possível e de modo a poder-se vir buscá-las a todo o tempo, se o sentimento nacional o exigisse-nos, porém, conhecíamos os paraguaios que precauções poderiam esconder-lhes semelhante depósito? 
Tipo de canhão e armão, da artilharia. Replica produzida para os eventos da Marcha da Retirada da Laguna, 2015 apresentação no passo do rio Miranda para a Fazenda Jardim, nas proximidades do antigo passo de 1867.

Demasiado sabiam quanto lhes tinham custado essas armas, para que pudessem elas escapar às pesquisas que não deixariam de fazer.

Fosse como fosse, tal sacrifício não nos era ainda imposto. Fora principalmente por causa dos canhões que o major José Thomaz Gonçalves lembrara-se de colocar o cabo e assistira ao êxito da experiência com sentimento de justificado entusiasmo. 
Desenho Canhão da Marca La Hittle utilizado durante a Guerra do Paraguai. Arquivo José Vicente Dalmolin

No dia 31 de maio, tornou-se notável o açodamento[4] com que todos puseram mãos à obra, qual para trazer a primeira peça ao lugar, qual para multiplicar os nós de amarra nos troncos de árvores da margem e segurá-los melhor, qual para fixar os laços que deviam facilitar a progressão do trem. O canhão pôs-se afinal em movimento e quando puxado de modo a correr ao longo do cabo por várias juntas de bois colocadas na margem fronteira, pareceu seguir regularmente, imensas aclamações ergueram-se de ambos os lados do rio e seguiram-no até que o viram sair d'água. No meio da torrente curvara tanto o cabo que se chegou a recear desaparecesse completamente.
Praça General Tibúrcio 
Monumento aos Heróis da Laguna e Dourados - Salvamento dos Canhões.   O salvamento dos canhões, entre a representação do Coronel Carlos Moraes Camisão e a do Guia Lopes.
Arquivo Edmilson Lima de Souza e José Vicente Dalmolin. Monumento Histórico do Cemitério dos Heróis da Laguna/2007

A segunda peça foi menos feliz! Escapou de uma das alças que a prendiam, destacou-se das outras e caiu no fundo do rio. Pouco faltou que o cabo se não rompesse, mas resistindo e assim libertando-se de improviso do peso que o sobrecarregava, açoutou[5] o ar com enormes jatos de espuma. Felizmente este incidente que foi acompanhado de grande agitação em ambas as margens, não comprometeu a existência de vida alguma.
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Notas de Referências:
[4] NE – Afobação; corre-corre.
[5] NE – Variante de açoitar. Dar com açoite. Fustigar. Bater. Devastar.
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a- O soldado Damásio recuperando a peça de canhão

Um soldado cujo nome merece ser conservado, Damásio, ofereceu-se imediatamente para mergulhar no lugar da imersão e tendo ido com efeito reconhecer o fundo, conseguiu, depois de haver voltado à tona d'água duas ou três vezes para respirar, passou em torno do canhão uma corda de que ia munido e que serviu para puxá-lo. Esta lição aproveitada para as outras duas peças quando se tratou de alceá-las, apressou o resto da operação e permitiu que se completasse a passagem nessa mesma tarde e na manhã seguinte.
Visão panorâmica da encenação no “Passo do Miranda” ou do “passo do Jardim” narrada e representativa da atuação do soldado Damazio que mergulhou no fundo do Rio Miranda e recuperou a peça de canhão que havia desprendida do cabo durante a travessia em 1867, Arquivo José Vicente Dalmolin e Edmilson Lima de Souza, 2016.

Parte II
Da Fazenda Jardim ao Rio Canindé, enfim estradas abertas e conhecidas

4- Enfim, toda a Força Expedicionária pisa no solo da Estância Jardim e os paraguaios voltam a atacar

No dia 1º de junho de 1867, à tarde, achamo-nos afinal todos reunidos ao redor da casa de Lopes no seu pomar despojado por nós dos seus frutos e para logo sem termos tomado nenhum outro repouso ou alimento estávamos já em marcha, quando o inimigo que passara para a margem direita lançou-nos os seus atiradores sobre a retaguarda.
Ponte móvel sobre o rio Miranda, no Passo atual entre o antigo acampamento das Forças Brasileiras (Cemitério dos Heróis) com a Fazenda Jardim. A ponte é montada pela 4ª Companhia de Engenharia de Combate Mecanizada, de Jardim e é utilizada durante os eventos alusivos a Marcha da Retirada da Laguna desde o ano de 1999 para o deslocamento dos participantes. Este local está aproximadamente uns 200 metros abaixo do antigo passo ou vau que era utilizado pela família do Guia Lopes para circulares de uma a outra margem das suas propriedades, por onde passaram as Forças em 1867 e serviu até o ano de 1938 como via de acesso entre Nioaque e Bela Vista. (As localidades de Guia Lopes da Laguna e Jardim não existiam até este período).

Comandava-a o valente Pisaflôres e dentro em pouco tinha repelido com o seu costumado vigor este novo ataque. O único inconveniente que disso resultou foi termos de fazer alto e demorarmo-nos ali até ao cair da noite, que cedo vem nessa estação[6].
Marco do “Passo do Jardim” – (atualmente no municípío de Jardim-MS) marcando presença e registrando os eventos, José Vicente Dalmolin à esquerda – no Centro Renato Francisco Lopes, neto, à direita Basilio Lopes, bisneto, do Guia Lopes.
10ª Marcha Cívico-Cultural da Retirada da Laguna. Arquivo José Vicente/2014. 
Inscrição do Marco:
Retirada da Laguna.
Passo do Jardim
30 de maio de 1867
Km 119

Marco na “Fazenda Jardim”, nas proximidades onde havia o antigo pomar das laranjeiras, casa e mangueiro de gado. Atualmente está Localizada no Município de Guia Lopes da Laguna, margem da rodovia MS 382 km Guia Lopes da Laguna à Bonito-MS. imagem 
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Notas de Referências:
[6] NE- As Forças encontravam-se no final da estação do outono, aproximando-se do inverno. No hemisfério sul o inverno inicia em 21 de junho.
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5- Pondo-se em marcha para Nioac, agora por estrada aberta e conhecida

Posto que não tivesse havido contraordem e a marcha estivesse apenas interrompida, não foi sem alguma admiração que ouviram-se as cornetas, depois de tocarem toque de recolher, como de costume, dar imediatamente o sinal para prosseguirmos. A impressão foi tanto maior e penosa quando a escuridão se tornava mais cerrada, e ainda mais próxima e violenta anunciava-se uma tormenta. Mas cada qual pensou logo na urgente necessidade de transpor, a todo o custo, a distância que nos separava da povoação de Nioac, cuja total destruição a menor demora de nossa parte podia acarretar.

6- Capitão Pedro José Rufino, o novo Guia das Forças em Operações no Sul da Província de Mato Grosso

Recomeçamos a marcha, tendo à nossa frente o capitão José Rufino que conhecia bem o caminho. À noite, apesar de sombria e tempestuosa, não nos ocultava a estrada que se abria diante de nós, larga e plana. A marcha era rápida. Poucos doentes nos restavam, pois perdêramos vários deles juntamente com o alferes Moniz nos dias precedentes. Entretanto os soldados que se alternavam carregando as padiolas começaram a murmurar, ameaçando livrarem-se das suas cargas.

Visão panorâmica da encenação em área da atual fazenda Jardim, no município de Guia Lopes da Laguna, margem direita do rio Miranda, Acampamento das tropas, Capitão Pedro José Rufino (esquerda) passando o comando ao comandante Major José Thomaz Gonçalves (Direita). Imagem José Vicente Dalmolin, 2016. 12º Jornada Cívica Cultural da Retirada da Laguna.

Este princípio de insubordinação que podia deitar tudo a perder, não teve tempo de desenvolver-se. O comandante, avisado, correu a toda brida para os amotinados com a espada levantada e encontrou-os pedindo perdão.

7- Os paraguaios à frente mas em fuga e apropriação de rês do seu gado

Daí em diante guardou-se silêncio na coluna, como fora ordenado. De repente, no meio da estrada, um posto paraguaio, ao qual as lufadas do vento e o rolar do trovão tiraram toda a suspeita de que nos aproximávamos, achou-se em nossa frente, sem que os latidos dos seus cães ou os mugidos do seu gado dessem o alarma.
Combatentes da Cavalaria Paraguaia em acampamento.

O nosso comandante que marchava à testa da coluna, mandou fazer alto e deu ordem de preparar para cair à baioneta sobre o acampamento inimigo.

Ele, porém, retirara-se a toda a pressa, deixando-nos livre a passagem. Não teve sequer o tempo necessário para reunir todo o gado que levava. Fugiram-lhe alguns bois que tomamos e que tiveram para nós inestimável valor, foram nada menos que a vida. 

Apesar de toda a necessidade que tínhamos de prosseguir, não foi possível recusar aos soldados o tempo preciso para carneá-los e comer parte deles, apenas chamuscada.
O gado era a base da tração animal para puxar as carretas e as peças de artilharia. Mas também eram indispensável para a alimentação.

Carregaram o que ficou para futura necessidade e ao atravessarem o posto abandonado, levaram ainda as rações que ali se achavam, e os próprios couros que consideravam como derradeiro e precioso recurso contra a inanição.

Pondo-nos de novo a caminho, a chuva acompanhou nos ainda, sem que nos demorasse a marcha. Porém, éramos obrigados a parar, de tempos em tempos, para que a Artilharia se reunisse a nós, estacava nos lugares piores e com ela, o batalhão da retaguarda encarregado de escoltá-la. Disso resultava muitas vezes, perturbação tanto maior quando as ordens eram comunicadas ao longo da coluna por meio de gritos agudos, sujeitos a várias interpretações. Avançámos, todavia destarte até às quatro horas da madrugada, momento em que, tendo sido dado o sinal de fazer alto, todos, extenuados de cansaço e de sono, deixamo-nos cair por terra, já dormindo, enrolados nos nossos ponches a escorrerem água, assim como a relva que nos servia de leito.

Duas horas depois, às seis, estávamos de pé e sentindo-nos mais fortes, graças ao alimento que tomáramos, continuamos, sob um céu sereno e uma temperatura agradável, a nossa interminável marcha para Nioac. Vendo por toda a parte na estrada, onde os paraguaios nos tinham precedido, retirando diante de nós, os rastos dos seus cavalos.
Marco Histórico, atualmente da cidade de Guia Lopes da Laguna, próximo a antiga estrada que interligava Nioaque a Bela Vista até a década de 1940.
Proximidades por onde passaram as Forças em Operações no Sul da Província de Mato Grosso no dia 1 de junho de 1867, em Retirada da Laguna, buscando o caminho de Nioac.

8- Aproximando-se da estrada e do Rio Canindé, 2 de junho 1867, a Marcha Forçada de sete léguas

Depois da nossa última alta, atravessávamos espessos cerrados onde os nossos soldados, não receando ataques de cavalaria, marchavam com segurança mais afastados uns dos outros e sabíamos que só tornaríamos a encontrar planície descoberta do Canindé em diante. Foi às duas horas da tarde que avistamos o bosque que tem este nome, assim como o rio, e lá chegámos às três horas, tendo feito sete léguas, motivo de admiração para nós próprios, no estado de fraqueza em que nos achávamos.

Um alto-relevo que se desdobra por 16,50 metros de extensão circular, por 1,80 metros de altura, representando A Marcha Forçada entre as estátuas de Antonio João e Guia Lopes. Arquivo Edmilson Lima de Souza e José Vicente Dalmolin. Monumento Histórico do Cemitério dos Heróis da Laguna/2007


Ponte sobre o Rio Canindé, afluente do Nioaque. Imagem cedida pelo CAT/Jardim-MS. 2004

a- No Canindé, a situação dos mercadores retornaram da Machorra

Ao atravessarmos o rio, foi encontrado o cadáver de um capataz de carros, chamado Apollinario[7], a quem os paraguaios acabavam de matar. Pertencia ao comboio dos mercadores que tinham parado na Machorra à espera de notícias e que, ao saberem dos nossos combates de 8 e 9 de maio, depois dos quais consideravam-nos perdidos, tinham julgado não poder fazer outra cousa mais que retroceder. Tinham gasto vinte[8] dias para alcançarem de novo o Canindé, onde encontraram tangedores de gado que ali nos deviam entregar uma ponta, mas, antes da nossa chegada, uns e outros haviam caído nas mãos do inimigo.
Imagem adaptada do Google Earth Pro, 2017. José Vicente Dalmolin
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Notas de Referências:
[7] NE - Apollnario Perelta de Sampaio chamava-se o carreteiro a que o autor se referiu. Informação contida em algumas versões mais recentes do Livro A Retirada da Laguna.
[8] NE – Considerando que os mercadores gastarão vinte dias entre a Fazenda da Machorra e o Rio Canindé, as Forças Expedicionárias gastaram 23 dias entre Nhandipá, Bela Vista do lado brasileiro de 11 de maio a 2 de junho mesmo com todas as calamidades e por caminhos selvagens. 
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Parte III
DOCUMENTO Nº 36 – Ordem do Dia do novo comandante

Quartel do Comando interino das Forças em Operações ao Sul da Província de Mato Grosso. Acampamento junto à margem direita do rio Miranda, na Fazenda do Bom Jardim, 1º de Junho de 1867.

ORDEM DO DIA[9] Nº 2 

Com profundo pesar notifico às Forças sob meu interino Comando o falecimento do Ilmo. Sr. Tenente-Coronel Juvêncio Manoel Cabral de Menezes, Chefe da comissão de Engenheiros, no dia 29 do mês próximo passado, no acampamento junto à margem esquerda do rio Miranda. 

Em virtude dos Avisos do Ministério da Guerra de 1º e 7 de Novembro do ano próximo findo, os quais dão nova organização à Comissão de Engenheiros junto a estas Forças, reduzindo-a a três membros oficiais pertencentes ao Corpo de Engenheiros e nomeando em caso de necessidade adjuntos a mesma, determino que passe a servir como único Engenheiro junto as mencionadas Forças o Sr. 1º Tenente daquele Corpo o Bacharel José Eduardo Barbosa, ficando os outros Srs. Ajudantes dispensados daquela comissão exercendo de ora em diante o Sr. Capitão do Estado Maior de 1ª Classe Bacharel Antonio Florencio Pereira do Lago, unicamente as funções de Assistente do Ajudante General. 

O Sr. Major de comissão Bacharel João Thomaz de Cantuaria, as de Comandante do Corpo Provisório de Artilharia. Assumindo o Sr. Tenente do Estado Maior de 1ª classe Catão Augusto dos Santos Rocho, o cargo de Assistente do Quartel Mestre General. O Sr. 2º Tenente de Artilharia Engenharia Bacharel Alfredo D'Escragnolle Taunay, a de Secretário deste Comando, pelo que fica dispensado do distinto lugar que preenchia cumulativamente com as funções de Engenheiro no mencionado Corpo Provisório de Artilharia, passando além disto o Sr. Alferes de comissão Amaro Francisco de Moura de Secretário Militar, Ajudante de Ordens deste Comando, em lugar do Sr. Tenente de comissão Joaquim Maria do Espirito Santo, o qual deverá se apresentar ao 1° Corpo de Caçadores a Cavalo, bem com o Sr. Tenente de comissão Querino José Rodrigues que comandou a Companhia de Índios e servia como encarregado de Polícia dos acampamentos. 

Reverte novamente a seu Corpo o Sr. Capitão Henrique Deslandes, o qual achava-se servindo como adido ao Batalhão 20º de Infantaria. Para conhecimento das Forças, transcrevo nesta data a decisão do Governo Imperial, exarada em aviso de 12 de Junho de 1866, sobre o assunto concernente a organização e serviço interno das mesmas.

Major José Thomaz Gonçalvez
Comandante Interino
Major José Thomaz Gonçalves, encenação em campo aberto em terras da Fazenda Jardim, margem direita, (Guia Lopes da Laguna – MS.) assumindo o comando das Forças Brasileiras. Evento 12ª Jornada Cultural da Retirada da Laguna, 2016.
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[9] Nota do autor, não consta qual foi a primeira ordem do dia do novo comandante

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